RELATÓRIO DE GESTÃO ABRIL 2024
Netflix: o terceiro ato da indústria de streaming
Em 2024, completaremos 5 anos como acionistas de Netflix. Nossa tese de investimento foi apresentada pela primeira vez em abril de 2020. De forma resumida, acreditávamos que:
(i) a migração de usuários de TV a cabo para streaming era uma tendência secular inevitável;
(ii) a Netflix havia construído uma série de vantagens competitivas que garantiriam a dominância da empresa como o serviço âncora de streaming no mundo;
(iii) isso permitiria que a companhia capturasse uma fatia desproporcional dos lucros do setor.
Montamos a posição a um preço médio de aproximadamente US$320. Após 2 anos com o investimento, a ação havia valorizado 116%, atingindo uma máxima de US$691 em novembro de 2021.
Nos 6 meses seguintes, a companhia iria atravessar uma tempestade perfeita. A maior alta de juros nos últimos 40 anos castigou o valuation de todas as ações, especialmente negócios de duration mais alta, como a Netflix, que ainda estava nos estágios iniciais de sua inflexão de geração de caixa. Esse período também coincidiu com uma desaceleração relevante do crescimento de usuários, amplificando a correção nas ações. De novembro de 2021 a maio de 2022, as ações chegaram a cair 76%.
Atribuímos a desaceleração a alguns fatores. Primeiro, a explosão de consumo durante a pandemia antecipou parte do crescimento futuro de usuários. Segundo, o crescimento na taxa de cancelamento (churn), que costuma suceder os aumentos de preço periódicos da empresa para depois convergir de volta à média, era amplificado pelo maior choque inflacionário dos últimos 20 anos e uma cadência de hits temporariamente mais fraca. Ainda, a disrupção nas cadeias de suprimento globais provocada pela pandemia também deprimiu as vendas de smart TVs, agravando o problema de captura de novos usuários.
A narrativa de competição, que havia se dissipado ao longo dos últimos anos, ressurgiu com força. No trecho abaixo, falamos sobre o cenário competitivo em 2020:
“A ideia de que esses novos serviços vão limitar o crescimento ou poder de preço da Netflix possui a premissa implícita de que esses são serviços substitutos. As diferenças de objetivo, a quase inexistente sobreposição de conteúdo, a divergência da magnitude das ambições e a falta de evidência de impacto competitivo de serviços que já coexistem há anos com a Netflix, como o Prime Video, apontam para uma relação mais complementar.
Ao contrário do que parece ser o consenso, acreditamos que o efeito preponderante do lançamento desses serviços deva ser a aceleração do declínio da TV tradicional, um fenômeno que beneficia a Netflix de maneira desproporcional.” – Relatório de 2020
Atualizamos modelos de dados que criamos em 2020 para analisar a concorrência e aprofundamos nossa análise, à procura de sinais de alguma inflexão competitiva. Não conseguimos invalidar nossa tese original. Não vimos evidências de consumidores substituindo a Netflix por outros serviços de streaming, nem mudanças relevantes de consumo. As métricas principais que monitoramos para avaliar a posição competitiva da companhia — churn, escala, principalidade e engajamento — continuaram a demonstrar sua liderança inequívoca no mercado.
No aspecto de pessoas, nossas conversas com ex-executivos, competidores e outras fontes próximas à empresa ratificaram a capacidade de adaptação e execução do time. Durante este período, a companhia mudou convicções internas e implementou mudanças importantes. Em menos de 6 meses, introduziu um plano com anúncios e sinalizou que iria começar a monetizar o compartilhamento de senhas. O primeiro plano tem o potencial de ser um relevante expansor de mercado, possibilitando um leque de preços mais amplo e introduzindo uma linha de receita correlacionada com engajamento, onde a Netflix lidera com ampla margem. O segundo, além de ajudar a acelerar o crescimento de usuários, deve ser um importante vetor de lucratividade, uma vez que a companhia já absorve os custos de servir esses clientes. Por isso, a receita marginal desse esforço de monetização deve vir com margens incrementais mais altas.
Enquanto isso, o mercado precificava as ações da empresa como se o crescimento tivesse se esgotado estruturalmente. Quando a ação atingiu seu valor mínimo, em maio de 2022, a Netflix chegou a negociar a 8x a nossa estimativa de lucro para esse ano – isso para um negócio onde enxergamos um crescimento de lucro por ação acima de 20% ao ano até o fim da década. Com o case revalidado e a oportunidade oferecida pelo ceticismo do mercado, decidimos comprar, recompondo a posição original.
Desde então, a ação valorizou aproximadamente 260%, atingindo quase o dobro do nosso preço médio original. Enquanto a Netflix gerou cerca de US$7 bilhões de caixa livre em 2023, estimamos que seus competidores geraram um valor semelhante em prejuízos no ano.
“O menor churn vence”
A Netflix é o único plano de streaming que se consolidou como um serviço essencial em escala global. Essa superioridade é melhor ilustrada pela comparação do churn entre as plataformas: a taxa de cancelamento da empresa é uma fração do resto, com a diferença ampliando-se ao longo do ano passado.
Essa vantagem de churn, por sua vez, permite que uma parcela significativamente maior dos investimentos da Netflix seja direcionada para crescimento em vez de compensar a perda de assinantes, amplificando a vantagem de escala do negócio.
O primeiro ato da indústria, há pouco mais de uma década, foi marcado pela Netflix adquirindo conteúdo a preços muito baixos de incumbentes que subestimaram o risco competitivo que estavam alimentando. Anos depois, percebendo o erro que cometeram, esses competidores retiraram esse conteúdo da Netflix e o utilizaram para lançar suas próprias plataformas de streaming. Desde que iniciamos nosso investimento, em 2019, sustentamos a visão de que competir diretamente com a Netflix pelo domínio do mercado seria uma tentativa fútil para players com escala inferior e negócios ainda amplamente dependentes dos lucros da TV a cabo – por sua vez numa trajetória cada vez mais evidente de declínio secular.
“A Netflix criou um modelo de negócios superior para produzir e distribuir séries e filmes em escala global. Hoje, a realidade financeira do negócio é fruto de uma decisão consciente de investir enfaticamente para posicionar o negócio para a próxima década. O tamanho da oportunidade e a probabilidade da companhia abocanhar uma fatia desproporcional desse mercado justificam esse ímpeto. Nenhum competidor se provou disposto a se comprometer com o mesmo afinco e investir na escala que seria necessária para competir diretamente com a Netflix – precisamente porque essa proposta seria economicamente irracional.” – Relatório de 2020
Atualmente, enxergamos o setor entrando em seu terceiro ato, com a maior parte desses competidores já reconhecendo a improdutividade dessa estratégia. Hoje, praticamente todos já optaram por reestabelecer acordos de licenciamento com a Netflix, incluindo Disney, Warner Bros. Discovery (Max), Comcast (Peacock) e Paramount, entre outros.
Nosso objetivo na IP é adquirir participações em negócios capazes de gerar valor substancial a longo prazo. No caso da Netflix, acreditamos que a companhia atingiu velocidade de escape frente aos seus competidores, que recuaram da competição direta, e está explorando um mercado potencial de mais de US$600 bilhões por ano[1]. Esse cenário, aliado a um modelo de negócios de receita recorrente, custos majoritariamente fixos e sob a liderança de um dos times executivos que mais respeitamos, ilustra a oportunidade que enxergamos para a empresa. Como sempre, continuaremos procurando evidências contrárias à tese, mas seguimos convictos de que essa combinação de fatores irá suportar um crescimento expressivo de lucros até o final da década.
[1] Dados baseados nas projeções da Omdia, PWC e SNL Kagan, que estimaram um gasto anual de US$300 bilhões em TV por assinatura e streaming, US$180 bilhões com gastos em publicidade de TV com marca e US$130 bilhões em gastos de consumidores com jogos, excluindo vendas de hardware, em 2022.
Aleatórias
“If your business model depends on inducing feelings of stupidity in your customer base, you can hardly expect to build much loyalty”.
— Reed Hastings, co-fundador e CEO da Netflix
“We spend a very small amount of time thinking about competition. We spend almost all the time trying to improve the service. And that’s because there’s nothing we can do about the competition.”
— Reed Hastings
“As the average tenure of the subscriber base increases, the average churn rate falls. So, if you and I both run competing subscription businesses and yours is older than mine, then even if our services are equally liked, with exactly the same churn curves by customer cohorts, your average churn rate will be lower than my average churn rate. Which means that more of your marketing dollars are going to support new subscriber growth. And more of my marketing dollars are going to replace churn subs. Which means you can grow faster than I can and beat me like a drum.”
— Barry McCarthy
“Once you’ve built up to 200 million or so subscribers, it’s very hard for anybody to come close. Eventually, the dollars will rationalize, and I think Netflix’s cash flow will be huge”
— Barry Diller
“Anytime you get into software, whether it’s entertainment or computer, it’s all about scale. Reed Hastings, who is a terrific businessman, saw early on that if he could drive a business on top of the internet, he had a global business. If he gets global scale, he’s the only guy who’ll be able to write the check to create the content at the level and quality that people will get used to. (…) This is a positive feedback engine that he’s got going. It’s brilliant. He’s got a big lead and I don’t believe anybody will catch him.”
— John Malone
“What we’ve learned since fifteen years ago is the importance of the direction of the competitive advantage versus the size of it.”
— Paul Black
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