RELATÓRIO DE GESTÃO JULHO 2023
Cenários, Previsões e o Norte
Introdução
No relatório de janeiro deste ano, quando o pessimismo imperava, comentamos que nos dois principais mercados acionários em que atuamos víamos uma quantidade incomum de excelentes companhias a preços deprimidos – o que nos sugeria retornos futuros bastante atrativos. Como capa do relatório, escolhemos a figura de uma escada, cujo ilusionismo nos remetia à percepção instável que os investidores historicamente têm em relação ao Brasil.
A psicologia negativa dos mercados começou a dar sinais de melhora nos meses seguintes – algo que nunca tivemos a pretensão de antever.
Buffett e Munger já se cansaram de repetir que previsões geralmente nos dizem mais sobre quem as fez do que sobre o futuro. No entanto, o exercício de “futurologia” segue com apelo aparentemente inabalável.
A recessão da economia americana, antes amplamente antecipada pela maioria dos participantes do mercado, não se materializou (ainda?). O amplo consenso pessimista no início do ano para a performance dos mercados acionários também se provou incrivelmente equivocado: ao final do primeiro semestre de 2023, o Ibovespa registrava +7,6%, S&P 500 +16,9%, Nasdaq +32,3% e MSCI World +13,9%. As previsões catastróficas de uma grande crise energética durante o inverno europeu também não se confirmaram. O PIB brasileiro também surpreendeu positivamente a maioria dos economistas.
Enquanto muitos investidores ancoram excessivamente suas decisões de investimento em “cenários” para os mercados, a dura realidade é que com maior frequência do que não, estes se provam demasiadamente equivocados. A imprevisível psicologia coletiva dos milhões de investidores somada à aleatoriedade dos mercados em prazos curtos, torna inviável prever corretamente os rumos dos mercados de maneira minimamente consistente. O momento atual pode ensejar uma saudável reflexão sobre o real valor e o peso que tais previsões e cenários devem ter nas decisões dos investidores.
Qual seria então, na nossa opinião, uma abordagem mais adequada? Inspire-se nos grandes empresários!
Pense bem. Quando um político com ideias econômicas ultrapassadas é eleito, o que geralmente um grande empresário, dono de um negócio sólido, rentável e próspero, faz com suas ações à medida que seus preços caem junto com o mercado? Nada.
Tal empresário pode até se ressentir e acreditar que o programa econômico do vencedor não será o melhor caminho para o país, mas nos dias seguintes vira a página, volta a se focar no seu negócio e simplesmente espera a tempestade passar. Se o negócio é realmente sólido, lucrativo, possui vantagens competitivas, margens e retornos atrativos, o empresário pode ter a tranquilidade de que sua empresa irá atravessar eventuais tempestades. Jamais passa pela sua cabeça vender suas ações a preços baixíssimos em meio ao pânico nos mercados. Ele sabe que, passada a tempestade, o preço de suas ações volta a convergir para o real valor do negócio.
Tal qual o empresário, temos um norte principal a nos guiar: o valor dos negócios. Na nossa experiência, o investidor que tem como norte o valor dos negócios e foca em encontrá-los a preços atraentes – ao invés de ancorar seus investimentos em previsões, opiniões e cenários incertos – tende a tomar decisões melhores e colher resultados mais consistentes ao longo do tempo. É o que buscamos fazer.
Perspectivas
A descompressão do mercado acionário americano tem elevado os níveis de valuation em alguns dos negócios que acompanhamos e admiramos no exterior. As ações das “big techs”, particularmente, se valorizaram em cerca de 40% a 50%, com os investidores precificando não só (i) o impacto da inteligência artificial em seus negócios como (ii) a agenda de cortes de custos e ganhos de eficiência que essas companhias têm promovido.
Como os leitores antigos sabem, admiramos enormemente estas companhias. A partir de 2012, com a inovação dos BDRs no mercado brasileiro, aumentamos significativamente nossos investimentos no exterior e algumas das “big techs” representaram uma parcela importante dos nossos fundos dali em diante. Eram investimentos vistos como polêmicos – ainda mais para gestores baseados no Brasil. À época, o consenso era que investir em tecnologia era perigoso. Nós enxergávamos por outro ângulo: eram modelos de negócios extremamente fortes, com tendências favoráveis de longo prazo, cujos efeitos de rede resultavam em ciclos virtuosos poderosos à medida que cresciam. Por não serem consenso naquela época, os valuations eram bem atrativos: podíamos investir em Microsoft a 10-11x sua geração de caixa, Alphabet (Google) a 13x, etc – em um período onde o crescimento era maior.
Hoje o trade-off é bem diferente. O amplo consenso de que tratam-se de negócios com vantagens competitivas excepcionais resultou em os valuations bem mais altos (Microsoft e Apple por exemplo negociam ligeiramente acima de 30x lucro[1]) e o crescimento esperado é menor.
Com a valorização ao longo do semestre, vendemos gradualmente nossos investimentos em Amazon e Microsoft, enquanto seguimos com nosso investimento em Alphabet. Realocamos esse capital ao longo do semestre para companhias igualmente fora da curva, mas onde vemos um downside mais limitado em cenários mais difíceis de mercado e um excelente retorno caso estejamos corretos em nossas teses. No exterior os principais aumentos foram em Visa, Mastercard, Thermo Fisher, Danaher, Accenture e Universal Music. Já no Brasil, os principais destinos para esse capital foram Equatorial, Itaú/Itaúsa, BTG, Energisa e Vivara.
Abaixo comentamos sobre nossos investimentos em Equatorial, Visa/Mastercard e Alphabet.
Equatorial
Em nosso relatório anterior, comentamos sobre o nosso investimento em Equatorial, holding de utilities com foco em distribuição de energia elétrica. Além de Equatorial, também somos investidores de Energisa, outro grupo relevante no segmento de distribuição. Ambos investimentos compartilham do mesmo racional – são monopólios regulados, de baixo risco operacional, tocados pelos melhores operadores do setor, negociando a valuations descontados em relação ao histórico de longo prazo.
Estas escolhas renderam bons resultados no semestre, com as ações de ambas empresas tendo valorizado em torno de 20%. Devemos atribuir cerca de metade deste resultado à queda dos juros de longo prazo no país (da ordem de 1p.p.), o que ainda implica em uma alta significativa por uma combinação de méritos das empresas e redução dos riscos percebidos pelo mercado. Do nosso ponto de compra mais relevante de Equatorial, próximo de R$22/ação em meados do ano passado, a valorização já chega a quase 50%.
Entretanto, o resultado não veio sem solavancos. O semestre foi marcado pela volatilidade das ações de distribuidoras de energia em virtude do processo de renovação das concessões com o governo federal. Cerca de 2/3 dos ativos de distribuição do país têm seus contratos de concessão previstos para vencer nos próximos 8 anos, incluindo cerca de metade da base da Equatorial e da Energisa[2]. Estes contratos, originados nas privatizações do final dos anos 90, estabeleciam um prazo de 30 anos, prorrogável por mais 30 anos “a critério do poder concedente” – deixando as condições em aberto, para serem definidas na ocasião do vencimento. Com a primeira destas concessões se aproximando da data limite de definição das condições para renovação, o setor passou por um semestre de intensos debates com o governo para perseguir termos razoáveis.
As discussões ainda estão em curso. O governo, representado pelo Ministério de Minas e Energia, tem se provado mais aberto e técnico do que o mercado esperava inicialmente. Para determinar as condições, preparou um processo de consulta pública cuja nota técnica foi publicada no final de junho. Nela, o governo reconhece o interesse mútuo em renovar (ao invés de relicitar) as concessões de distribuição bem operadas, destacando riscos relevantes de uma eventual troca de controle. Também considera a possibilidade de não haver excedente econômico a ser cobrado na renovação, por este já ser regularmente capturado pelo regulador nas revisões tarifárias. Por fim, muda o foco da discussão, antes excessivamente focada na captura de excedente econômico, para um potencial redirecionamento de recursos setoriais, que passariam a financiar investimentos sociais (ao invés de reverter para a tarifa de todos).
Embora esta fosse a diretriz racional a se esperar, o mercado considerava a possibilidade de uma redação mais draconiana, que desafiasse a razão em prol de viéses ideológicos ou arrecadatórios. A nota técnica afastou boa parte dessa preocupação, e as ações responderam com um rali de quase 10% nas duas semanas subsequentes.
Nos meses que antecederam este evento, nossa análise indicava que estávamos sendo amplamente bem recompensados para correr o risco das renovações, que julgávamos ser menor do que o mercado precificava à época. Levamos portanto Equatorial ao posto de maior posição do fundo por um breve período, acompanhada de uma posição de médio porte em Energisa. Aqui, reforçamos as vantagens de investir apenas nos melhores operadores do setor – acreditamos que o governo e esses dois grupos têm uma relação de dependência mútua, benéfica para todos. Os bons operadores realizam os investimentos necessários na rede ao mesmo tempo em que barateiam a tarifa através de eficiência operacional, revertida para os consumidores pelos mecanismos da regulação. O governo, por sua vez, depende dos bons operadores para garantir um serviço de qualidade a um preço acessível, já tendo vivido diversas experiências problemáticas no passado que custaram caro.
Além disso, a ordem dos vencimentos e o volume de recursos que as alternativas podem movimentar nos parecem determinantes para a decisão do governo. No mandato do atual governo, apenas 3 concessões vencem: EDP Espírito Santo, Light e Enel RJ – operações difíceis, sem muito excedente econômico, de onde o governo teria pouco a arrecadar via cobrança ou relicitação. Para envolver as concessões subsequentes, o governo precisava apresentar condições adequadas que fizessem com que elas optassem por uma antecipação da renovação. Caso elas antecipem, estima-se que a solução de redirecionar recursos setoriais para investimentos sociais tenha o potencial de movimentar até 10 vezes mais recursos do que uma eventual cobrança limítrofe das distribuidoras, tornando ela a melhor opção para os objetivos do próprio governo. Por fim, caso o governo ainda assim decida por condições duras ao final do processo, as concessões problemáticas não terão condições de renovar e precisarão ser absorvidas pelos melhores operadores – justamente as nossas investidas.
O processo deve ser concluído até o final do ano, restando a eventual cobrança de excedente econômico ainda indefinida. Uma cobrança nesse sentido não nos parece correta do ponto de vista econômico, mas há de ser considerada. Em todo caso, mesmo nossas contas mais pessimistas apontam para valores que não impactariam nossos investimentos em mais de alguns pontos percentuais de valor[3].
Dito isso, os preços atuais já incorporam parte relevante da redução do risco percebido desse evento, o que torna a assimetria entre preço e valor menos interessante hoje. As empresas ainda figuram entre as principais posições do fundo, pois mesmo nos patamares atuais acreditamos que trarão bons retornos em janelas longas, mas estamos navegando com maior cuidado atualmente, tendo redirecionado parte do capital para outras oportunidades.
Visa e Mastercard
Ao longo do semestre, iniciamos um investimento em Visa, que se soma à posição de Mastercard, parte das carteiras da IP desde 2017.
Desde a pandemia, as empresas navegaram sob diferentes narrativas de risco. Inicialmente, o debate se concentrou no risco de disrupção por redes de pagamentos baseadas em blockchain e tecnologias nascentes como o Buy Now Pay Later.[4] Mais recentemente, o foco migrou para o ambiente regulatório americano, com a implementação iminente do “Pix americano”[5] e a introdução de um projeto de lei que pretende revisitar a taxa de intercâmbio e as regras de roteamento de transações de crédito[6].
Em ambos os casos, enxergamos um risco limitado para as bandeiras. A vantagem competitiva da Visa e Mastercard não está calcada na tecnologia da sua rede física ou em alguma leniência regulatória, mas sim no poderoso efeito de rede que é produzido a partir dos mais de 4 bilhões de detentores de cartões, 100 milhões de lojistas e cerca de 20 mil instituições financeiras que se conectam às bandeiras para viabilizar o comércio global de pagamentos digitais.
A escala dessa rede comercial cria uma poderosa barreira de entrada, conferindo um duopólio global para as duas empresas. Prova dessa vantagem competitiva está no fato de que praticamente todos os negócios mais inovadores criados no setor de pagamentos na última década essencialmente concluíram que é mais vantajoso se tornar um parceiro das bandeiras do que tentar competir contra elas. Square, Stripe, Adyen, Paypal, Amazon, Apple Pay, Google Pay, entre outros, utilizam a rede da Visa e Mastercard. São, na verdade, fortes aliados que aceleram a transição secular para pagamentos digitais.
Apesar da alta semelhança entre os dois negócios, nós até então mantivemos uma preferência histórica por Mastercard. Quando iniciamos o investimento, em 2017, ambas as companhias negociavam aproximadamente no mesmo múltiplo – por volta de 25x lucro. Enxergávamos um crescimento de lucro mais alto na Mastercard, função de um mix de volume de pagamento mais exposto a mercados menos penetrados e uma margem propositalmente mais comprimida por reinvestimentos no negócio. Nossa hipótese se confirmou ao longo do tempo, com a Mastercard diminuindo o diferencial de margem operacional para Visa em 400bps e crescendo seu lucro por ação a uma taxa de 19% a.a. desde então, comparados a 16% a.a. da Visa. Como o múltiplo de Mastercard expandiu para cerca de 28x[7] nesse período, o retorno total da ação foi de 21% a.a., comparado com 16% a.a. para Visa e 12% a.a. para o S&P 500.
Para frente, acreditamos que o diferencial de crescimento que ainda enxergamos em Mastercard já se reflete no múltiplo mais alto da ação, o que nos fez optar pela adição de Visa ao portfólio. Nos últimos 3 anos, o lucro por ação estimado da Visa cresceu 67%, equivalente a uma taxa composta de 19% a.a. Nesse mesmo período, a ação valorizou apenas 8% a.a., resultando em uma compressão de múltiplo significativa, de 35x para 24x[8].
Tanto Visa como Mastercard pertencem a um seleto grupo de empresas que conseguem expandir seu lucro a altas taxas sem qualquer necessidade de reinvestimento de capital relevante. O mercado raramente oferece esses capital-light compounders a preços verdadeiramente atrativos. Quando isso acontece, nós optamos por agir rapidamente. Hoje, carregamos posições de tamanho semelhante em ambas, que, somadas, estão entre as 5 principais posições dos fundos.
Alphabet
O primeiro semestre foi marcado pelo hype sobre inteligência artificial (IA). Vencedores e perdedores foram rapidamente declarados e suas ações reagiram fortemente. Alguns dos negócios que investimos, como Microsoft, estavam firmemente no campo vencedor. Alphabet, por sua vez, inicialmente foi dada como perdedora. Em fevereiro, com os anúncios pela Microsoft do Bing Chat e do copilot[9] para o Office, o mercado puniu suas ações com a percepção de que o Google estaria severamente ameaçado. De peito estufado, Satya Nadella, CEO da Microsoft, habilmente insuflou a narrativa dizendo que a Microsoft faria o rival “dançar”. Alguns meses depois, a confiança do mercado no Google se recuperou com anúncios de novos produtos no evento anual Google I/O.
Nós aproveitamos o pessimismo momentâneo para aumentar levemente nossa exposição, após concluirmos, com a ajuda de diversas conversas com ex-executivos do Google e da OpenAI, que o risco da empresa ficar para trás é baixo. De forma resumida, o que buscamos diagnosticar foi: i) se a Alphabet historicamente demonstrou tanta competência em IA, por que não lançou um produto análogo antes do ChatGPT surgir? ii) Veremos perdas relevantes de margem ao rodar esses sistemas? iii) Veremos perdas de receita ao rodar esses sistemas? iv) Existe um feedback loop poderoso e automático aqui, que poderia dar à OpenAI e à Microsoft uma vantagem sustentável pelo mero fato de que lançaram o produto mais cedo? v) Por fim, essa tecnologia poderia significar o início da obsolescência do mecanismo de busca, nas mãos de um concorrente?
Mencionamos abaixo alguns dos pontos que julgamos pertinentes para avaliar a posição do Google na corrida de IA.
Sobre a liderança. A Alphabet já vinha trabalhando com Large Language Models (LLMs) análogos aos da OpenAI há anos. É sabido que a tecnologia transformer, na qual esses modelos se baseiam, foi inventada no Google. Em junho de 2022, os modelos já eram convincentes o suficiente para que um pesquisador da empresa viesse a público dizer que a máquina estava consciente[10]. A razão da tecnologia não ter se transformado em produto foi a cautela da companhia com a segurança desses modelos, que frequentemente dão respostas incorretas e perigosas, aparentando absoluta confiança. Há até mesmo casos de startups em que o modelo sugeriu o suicídio[11] do usuário. No debate interno do Google, atentos à experiência dolorosa do Facebook nos anos anteriores, a decisão que prevaleceu foi a de priorizar a confiança dos usuários. Por isso, restringiram inicialmente os modelos a testes limitados a poucos beta testers.
Para a OpenAI, uma startup, e a Microsoft, que tenta há anos sem sucesso ganhar mercado com o Bing, o cálculo foi diferente. Reconheceram a oportunidade e trabalharam juntas para transformar a tecnologia em produto, encantando o mundo com o ChatGPT e o Bing Chat. Os erros e alucinações dos modelos foram relevados pelo público, muito mais interessado na grande utilidade que já oferecem. No Google, finalmente, havia a urgência em transformar a tecnologia em produto.
Quanto ao custo, está claro que os modelos são muito intensivos em processamento. Sam Altman, CEO da OpenAI, chegou a dizer que cada conversa custava centavos de dólar para rodar. Rapidamente, correu-se para calcular que se o Google adotasse os modelos, sua margem seria severamente comprimida. O que ouvimos de quem trabalha na área é que a questão é sim pertinente, mas há inúmeros atenuantes. Para começar, a tecnologia é nova, imatura, e está rapidamente se tornando mais eficiente. Pesquisadores estão progressivamente aprendendo a comprimir os modelos, retendo muito da sua funcionalidade com demanda computacional menor. Além disso, IA não é novidade para a divisão de Search. O Google já lida com modelos sofisticados no serviço de busca e outros produtos há anos, além de desenvolver chips (TPUs) proprietários para rodá-los. Uma das grandes habilidades da empresa é justamente lidar com computação complexa em escala. Com performance análoga a dos chips (GPUs) da Nvidia, os TPUs permitem que o Google limite sua exposição às margens gordas cobradas pela Nvidia e desvie dos limites de oferta de GPUs que afetam hoje o setor. Não esperamos uma queda abrupta nas margens por causa de IA.
Sobre a monetização: se os usuários passarem a se satisfazer com respostas produzidas por IA, e deixarem de clicar em links de anúncios, a receita do Google não estaria ameaçada? Aqui é importante notar que apenas aproximadamente 2% das buscas do Google resultam em clicks pagos.[12] 70% das buscas são por informações ou pelo link de um site específico. Empresas anunciam no Google em busca de vendas e controlam seus gastos de acordo com o retorno que obtêm desse investimento. Achamos pouco provável que ao oferecer mais valor aos usuários o Google ficará menos hábil em gerar vendas ou monetizar essas transações. Pelo contrário, enxergamos um novo caminho de sofisticação do serviço. A monetização virá naturalmente e poderá ser ainda mais poderosa. Ademais, a empresa tem enorme experiência em otimizar sua máquina de monetização enquanto evolui continuamente seus produtos. Não esperamos uma quebra relevante de trajetória aqui.
Por conhecer o poder dos efeitos de rede, nossa maior preocupação foi diagnosticar se a liderança inicial da Microsoft e da OpenAI poderia iniciar um feedback loop automático entre volume de uso e qualidade das respostas que tornasse o ChatGPT e o Bing Chat rapidamente melhores ao ponto de se tornarem inatingíveis para um player competente mas atrasado como o Google. Nossas conversas indicaram que esse risco ainda é baixo. Primeiro, porque este não é ainda um mercado com efeitos de rede relevantes. Os complementadores, como plugins do ChatGPT, ainda são muito incipientes. Segundo, porque ao contrário de modelos anteriores de IA, como os usados pelo YouTube, TikTok, Facebook, Instagram, Netflix e outros para refinar automaticamente a experiência com a captura de micro reações dos usuários, os LLMs ainda precisam de processos de curadoria envolvendo humanos para melhorar. Há sim espaço para usuários avisarem que não gostaram de uma determinada resposta, mas isso é um sinal insuficiente para tornar o produto melhor, apenas o primeiro passo numa cadeia complexa de refinamento. É sem dúvida útil já ter um volume relevante de usuários, mas não parece uma vantagem poderosa o suficiente a ponto de excluir competidores competentes – em particular o Google, que com sua enorme distribuição poderá rapidamente fazer a sua própria máquina de otimização girar.
Por fim, será que essa tecnologia poderia erodir a posição do Google por oferecer uma solução superior? É cedo para certezas, mas vale mencionar algumas vantagens do Google nessa corrida. Há na empresa não só um volume enorme de talento acumulado ao longo de anos de pesquisa na área, como também importantes vantagens de distribuição e de dados. De acordo com a Statcounter, a busca do Google teve em junho 96% do mercado de celulares e 84% do mercado de computadores. Sua marca é fortíssima, os hábitos dos usuários profundamente consolidados, e os acordos de distribuição com a Apple e os fabricantes de Android, além da forte presença do Chrome nos PCs, tornam isso difícil de mudar rapidamente[13]. Julgamos que o Google tenha não só tempo para reagir como amplo espaço para introduzir sua própria solução e rapidamente melhorá-la observando a experiência dos usuários.
A vantagem de dados também é relevante. Ela vem não só do alcance superior mas também da tecnologia que o Google consolidou ao longo dos anos para tirar sentido dos dados, com o chamado Knowledge Graph. Já passou o tempo em que o Google lidava meramente com palavras (keywords). Hoje, o Google gerencia um banco de dados gigantesco que diferencia entre entidades, como objetos e pessoas, reconhecendo os atributos de cada um. Com modelos de IA já em uso, como o BERT[14], é capaz de entender bem melhor a semântica do que os usuários estão efetivamente buscando. Além disso, o Google construiu ao longo dos anos uma expertise profunda em diversas verticais pertinentes aos usuários, como livros, produtos, vôos, hotéis e mapas – além da biblioteca inteira do YouTube. Hoje, as limitações dos LLMs são mais informacionais do que linguísticas ou mesmo lógicas. A fronteira do produto está em ter as informações corretas para cada contexto. A superioridade em dados dá ao Google boas ferramentas para oferecer um assistente turbinado por LLMs melhor que o da competição.
Até agora, os efeitos do lançamento do Bing Chat sobre a posição de mercado do Google foram imperceptíveis. Ao mesmo tempo, o crescimento do ChatGPT – inicialmente fenomenal – dá sinais de desaceleração[15]. O que ficou claro nas nossas conversas é que, por mais que a tecnologia já seja bastante útil e capaz de sacudir alguns setores, será necessário ainda muita pesquisa e refinamento para que ofereça um oráculo confiável com todo conhecimento da humanidade.
Vemos a posição da Microsoft como interessante, não por causa do Bing, mas sim porque a tecnologia LLM na sua forma atual encaixa bem no conceito de copiloto – como a empresa está utilizando – e seus relacionamentos corporativos a permitem cobrar por essa produtividade adicional. Além disso, serviços de IA tendem a impulsionar as vendas e a posição competitiva do Azure (e também do Google Cloud). Após a alta recente, entretanto, as ações nos pareciam menos atraentes e decidimos liquidar o saldo do investimento. Temos hoje nos interessado mais em diagnosticar falsos perdedores do que perseguir os vencedores consensuais nesse campo.
Ao final de junho, Alphabet acumulava 36% de alta no ano. Ainda assim, vemos na empresa um negócio espetacular negociando a preços bem razoáveis, enquanto outras Big Techs têm atingido patamares de valuation mais questionáveis. Seguiremos acompanhando o tema, sempre dispostos a mudar de opinião.
Aleatórias
“Surviving on average is a useless concept; you have to be able to survive all the time, including – no, especially – in bad times.”
— Howard Marks
“If one does not know to which port one is sailing, no wind is favorable.”
— Seneca
“Do not trust financial market risk models. Reality is always too complex to be accurately modeled. Attention to risk must be a 24/7/365 obsession, with people – not computers – assessing and reassessing the risk environment in real time. Despite the predilection of some analysts to model the financial markets using sophisticated mathematics, the markets are governed by behavioral science, not physical science.”
— Seth Klarman
“The central principle of investment is to go contrary to the general opinion, on the grounds that if everyone agreed about its merit, the investment is inevitably too dear and therefore unattractive.”
— John Maynard Keynes
“Read last year’s market predictions and you’ll never again take this year’s predictions seriously.”
— Morgan Housel
“Forecasts usually tell us more of the forecaster than of the future.”
— Warren Buffett
“It seems counterintuitive at first. If you spend a lot of time studying businesses all over the world, you would think your circle of competence would widen over time and you would find more ideas, not fewer ideas. However, it doesn’t work that way in my experience. Over time, you get pickier. Your checklist grows longer. And so naturally the list of companies that hit all those boxes starts to get shorter.”
— Chris Mayer
Notas de Rodapé
[1] Múltiplo calculado com base no lucro esperado para os próximos 12 meses
[2] Se considerada a exposição pro-rata às concessões, a Equatorial tem apenas 1/3 da sua base a vencer. Além disso, a Equatorial possui maior diversificação de negócios do que a Energisa. Ponderados estes efeitos, a exposição da Equatorial ao evento da renovação das concessões de distribuição, em termos de valor pro acionista, é cerca de metade da exposição da Energisa.
[3] Nossas contas consideram isonomia na cobrança entre as concessões do setor, de forma que nenhuma concessão seja penalizada por regras individualmente aplicadas a ela. Poderíamos imaginar impactos mais severos, mas estes implicariam em violações importantes de princípios contratuais.
[4] O BNPL (Buy Now Pay Later) é uma solução de pagamento à prazo que não precisa ser necessariamente financiado a partir de um cartão. Apesar disso, nos EUA, por exemplo, mais de 80% das transações são pagas com um cartão de débito, remunerando a Visa e Mastercard.
[5] O novo modelo, conhecido como FedNow, prevê a modernização do sistema de pagamentos americano para uma nova infraestrutura que permita transações instantâneas. Seu lançamento está previsto para o mês de julho.
[6] Acreditamos que o projeto de lei tem probabilidade baixa de ser aprovado no Congresso e que, mesmo se aprovado, tem um impacto potencial de entre 0-2% da receita da Visa e Mastercard.
[7] Múltiplo calculado com base no lucro esperado para os próximos 12 meses.
[8] Múltiplo calculado com base no lucro esperado para os próximos 12 meses.
[9]Copilot é a solução da Microsoft que utiliza modelos de inteligência artificial da OpenAI para produzir sugestões e rascunhos de documentos para o usuário.
[10] https://cajundiscordian.medium.com/is-lamda-sentient-an-interview-ea64d916d917
[11] https://www.vice.com/en/article/pkadgm/man-dies-by-suicide-after-talking-with-ai-chatbot-widow-says
[12] Fonte: Semrush.
[13] A não ser por antitruste… Estamos atentos.
[14] https://pt.semrush.com/blog/bert/
[15]https://fortune.com/2023/07/06/chatgpt-not-booming-anymore-loss-users-summer-vacation-kids-homework/
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